segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

Sobre Ela

              
Ela sempre esteve ali, mas só a pouco tempo prestei atenção. Só a pouco tempo notei sua beleza, mesmo sem conhece-la direito.
Não sei como, mas eu consegui me aproximar. Apenas um oi, apenas um olá. Ela me acolheu tão bem, praticamente me pegou pela mão e me levou pra dançar.
Me apresentou lugares inomináveis, que provavelmente eu jamais iria. Lugares belos que a solidão dos eventos sempre fizeram parecer cinzentos e sem graça.
Ela me fez lembrar da paixão pelo desconhecido, na verdade, sempre compartilhamos dessa paixão, mas nunca dissemos nada pra ninguém.
O silêncio de sua imagem refletida em um espelho passou a ser tão convidativo quanto o sorriso da mais linda das mulheres ou dos versos mais articulados de um trovador.
O que dizer dela? Tão simples, mas aparentemente tão complexa.
Encanto. Talvez essa seja a palavra que mais falei depois de dar ouvidos a ela, que quase me fez confundir o real da mera ilusão.
Pra falar a verdade, acho que nem sei o nome dela. Para mim, ela poderia ser chamada de tudo ou de nada. De calmaria ou tempestade. De maravilhosa ou de incontrolável. Ainda não sei.
Acho que por enquanto ela pode ser chamada apenas de Vida.

segunda-feira, 2 de janeiro de 2017

Sobre a vida

Hoje eu pensei sobre a vida.
Eu sei que é estranho, provavelmente difícil de entender, mas acho que é como eu disse pra uma amiga minha uma vez, que ser contemplativo as vezes tem suas vantagens, e dessa vez eu acabei pensando  demais em mim mesmo. Geralmente eu odeio isso, mas dessa vez eu tenho certeza que esses pensamentos levaram a algumas respostas bem interessantes, ou não, quem vai saber.
Não sei dizer quando exatamente essas idéias começaram a vir, mas eu tenho quase certeza de que foi em uma festa, dessas bem animadas, todos curtindo felizes, e eu, como sempre, encostado em uma parede, com cara de paisagem e uma garrafa de cerveja na mão, simplesmente observando, o quanto todos conseguiam se divertir e eu não, quando meus olhos pararam nela, uma menina que eu havia conhecido a pouco tempo. "Nossa, ela era tão bonita assim?"_ Pensei.
Lá, parado, observando atento a ela, vi o quanto ela estava pulando feito louca enquanto tocava alguma música que eu não conhecia do Legião Urbana, percebi o quanto as luzes pulsantes da iluminação transformava tudo em um grande momento lindo e  alucinante que, por algum motivo, eu não conseguia participando.
Eu queria estar lá, eu queria estar pulando junto deles, junto dela, mas alguma coisa muito mais forte que eu me prendia no lugar onde eu estava, me impedindo de estar lá, algo exercendo pressão no meu peito, me imprensando na parede, como uma grande negação. Isso de alguma forma me deixou triste, afinal eu queria estar feliz, mas nunca conseguia.
Dei uma golada na cerveja e senti o líquido descendo pela minha garganta, me refrescando os pensamentos. Por um instante minha mente deixou aquele lugar barulhento e vagou pela lembrança de uma paisagem mais solitária, de um dia em que mudei minha rota e terminei vagando pela zona portuária da cidade. Lá eu me sentei na grama e fiquei por horas sem falar nenhuma palavra, apenas observando o horizonte e meditando sobre os vais e vens do universo, sobre todas as pessoas que aparecem na nossa vida e todas as que se vão sem sequer dizer adeus, sobre as probabilidades boas e ruins que a inevitabilidade dos nossos dias podem nos dar, sobre o passar acelerado dos dias, que com um único acontecimento podem vir a se tornar os mais lentos de nossas vidas.
Era final de tarde e, ao longe, o brilho avermelhado do sol refletia na água, que tocava suavemente as pedras das margens do porto. Por vezes uma ou outra pessoa cruzava meu campo de visão, patinando ou andando de skate, outras ficavam na beira das grades de proteção observando e aplaudindo a buzina de grandes navios de viagem que estavam de partida. O vento fresco e úmido tocou meu rosto como um carinho, me lembrando que era hora de partir, então me levantei e dei uma última olhada ao redor, para que a imagem sempre estivesse guardada na minha mente quando eu precisasse lembrar de um momento só meu em um lugar agradável.
Novamente um toque em meu rosto que enfim me fez acordar. Retornei a festa, agora já tocando algumas versões das músicas do Charlie Brown, e o que estava tocando meu rosto não era o vento, mas um toque suave das mãos da garota que eu estava observando a um tempo. Ela me olhava com um olhar brilhante e preocupado, me perguntando se eu estava bem e, frustrado por ter feito ela sair de onde estava pra vir me perguntar isso, eu acabei explicando pra ela toda a situação, sobre a minha falta de interação com todo aquele povo animado, sobre, mesmo querendo, eu nunca conseguir e o quanto isso me desanimava. 
Ela sorriu, encostou na parede bem ao meu lado e me tirou a cerveja da mão, deu uma golada que quase acabou com todo o conteúdo da garrafa e bateu com ela na minha cabeça. 
"Sabe, eu acho que te entendo. Você passou por uma fase difícil da sua vida e de uma hora pra outra quer fazer uma grande mudança maluca, fazer coisas totalmente diferentes do que sempre fez, surtar, ser vida loka né?"_ falou rindo, mas logo sua voz mudou para um tom mais afetivo_"Eu sei bem como é. Mas faz o seguinte? Tenta dar tempo ao tempo, deixa que ele te ajude a mudar, você não vai conseguir fazer isso de uma hora pra outra e se sentir bem com isso. As vezes você está querendo mudar e começar a fazer coisas que não são a sua, entende? Só vai com calma que você vai se agitar também."_ terminou me devolvendo a garrafa. 
Sim, eu entendi. 
Observei ela pulando de volta na multidão pra voltar a dançar e pensei nas verdades do que ela disse. Não sou obrigado a gostar de fazer o que nunca fiz, um pulo tão grande pra fora do cantinho chamado de zona de conforto tem por lógica ser como um susto para a mente de quem não se preparou direito. Me permiti dar o primeiro sorriso verdadeiro da minha noite enquanto coçava a cabeça aonde levei uma garrafada. Eu estava sozinho ali, mas agora talvez conseguisse ver aquilo tudo por outra ótica. Acho que as vezes só precisamos das palavras de alguém (e de uma garrafada) pra compreender como a vida é uma loucura com regras abstratas.
"Vem"_ tomei um susto com alguém segurando minha mão e me puxando, era ela de novo_"não pensou que você ia escapar de uma dança né?"
Não, eu não estava sozinho. Não tenho a obrigação de passar por nada mais sozinho, como fiquei no dia do porto, olhando o mar sozinho por horas, ou como eu estava nessa festa até agora ou em tantas outras vezes achando que isso seria melhor. Tenho que aprender a aceitar a pouca ajuda que o universo me disponibiliza, curtir o momento da maneira que eu posso. 
Bebi o resto da cerveja e larguei a garrafa no primeiro lugar que alcancei. Permiti meu corpo ser puxado por ela até a multidão, com o incentivo certo, pouco a pouco fui me soltando. Pulamos e dançamos como duas crianças loucas o resto daquela noite, talvez, aquela que seria a primeira noite do resto da minha vida.