Era uma manhã linda e ensolarada, como tinha
sido nos dias anteriores,o termômetro marcava 45ºC,pela terceira vez na
semana,o ar estava denso e quente.Um simples andar pelas ruas ja deixava
cansado,mas eu sabia que não podia relaxar com minhas obrigações.Eu estava
sentado em minha poltrona de veludo ao lado de minha escrivaninha de trabalho e
de frente a janela,observando o movimento lá fora.
Eu trabalhava em um escritório chique da
Policia Federal do Estado do Rio de Janeiro e vez ou outra saia em missões de
campo,agora com mais frequência,devido a baixa do pessoal de campo.Um dos meus
melhores amigos era o meu parceiro de trabalho,Caio,mas muitos lhe chamam de
nicotina,por causa do cigarro que ele nunca tira da boca.
Nos últimos dias,a gente vinha trabalhando em
um caso interessante:artigos religiosos e supostamente místicos estão sendo
roubados com freqüência e os principais suspeitos são os membros de um grupo secreto
existente à alguns anos.
Eram 15:35 quando meu celular tocou:
__Alô,Jason?! Alôôôô!_Pela voz eu já sabia
que era o Caio!
__O que você quer cara,eu to trabalhando!
__Seu idiota!Era sobre isso que eu queria
falar.Eu segui o rastro de um desses doidos com cara de nerd.
__Sério?! Onde você está? Eu já estou
indo.__Disse eu enquanto me levantava pegando as chaves do carro.
Fui até a garagem e peguei meu Honda Civic
cinza escuro com motor importado.Acho que aquela belezinha chegava de 0 a 100 Km/h em 15 segundos,mas claro que
nunca usei todo seu potencial.Quando o comprei pedi para que transformassem ele
em um conversível,pois adoro o vento no rosto, sempre deu a sensação de poder
voar.
Eu estava indo o mais rápido possível para
onde Caio me falou,Rua Violeta 295,aqui mesmo em Oswaldo Cruz. Não sei bem por
que mas eu tinha uma impressão terrível que as pessoas me encaravam
muito,talvez seja meu jeitinho de "play boy".Eu estava usando uma
camiseta preta, uma coisa meia rockeira dos anos 90, uma munhequeira no pulso
esquerdo e um spike no direito, óculos escuros na cara e quando eu me olhava no
retrovisor via meus cabelos louros recém cortados pouco abaixo da orelha voando
com o vento. Uma corrente com uma cruz no pescoço e outra pendurada na calça, minha
pistola estava no banco do carona, e eu estava louco pra usá-la!
O caminho estava muito
ruim,parece que teve um acidente em uma das rotas mais rápidas para o meu
destino,então tive que dar uma volta maior,o que me irritou um pouco.
Ao chegar lá, reparei que
Caio estava agachado perto de um latão de lixo,se escondendo. Sabia que não
seria brincadeira. A alguns meses rolou o boato que esse grupo matou vinte
pessoas a sangue frio,supostamente para um ritual a um desses capetinhas loucos. Esse episódio ficou conhecido como massacre do Parque São Bento.
Ele estava usando uma
camisa branca com um colete da polícia por cima, calça larga com desenho
militar. Na cabeça, uma bandana segurando seus cabelos loiro-acinzentados
rebeldes, e é claro,com aquele maldito cigarro na boca!!!
Fui me juntar ao meu
amigo fumante, preparado, peguei minha pistola, uma .40 básica, já esperando ter
que usá-la,e me dirigi para o lado dele.
__O que está acontecendo aqui?__perguntei, para ficar entendido do
assunto.
__Boa tarde pra você também!__disse ele sarcasticamente__ Três
pessoas com roupas negras e capuz.Eles se dirigiam uns aos outros por nomes
estranhos, como Akrael ou Calistiel, sei lá, alguma coisa assim.
__Que nomes estranhos__disse eu enquanto examinava a porta. Estávamos
em frente a um deposito abandonado. A porta era grande e feita de ferro, estava
com uma aparência meio enferrujada e provavelmente se abrissemos ela,não seria
uma coisa silenciosa.
Do lado direito da porta tinham uns sacos grandes, pretos, com
muitas moscas sobrevoando eles e com umas marcas pretas no chão envolta desses
sacos. Qualquer um que visse acharia que era apenas chorume, o liquido eliminado pelos lixos das casas de todo o mundo, mas, quando você trabalha 3 anos na
policia federal, sabe distinguir esse liquido de sangue ressecado, que em contato
com algumas substâncias do solo acabam ficando mais escuro.
Do lado esquerdo havia um
pequeno corredor que não tinha saída,entretanto,se seguíssemos nele iriamos ver
outra porta,que deveria ser a entrada dos fundos,e uma escada para o teto.
Por mais que fosse
perigoso,nós decidimos nos separar.Tiramos par ou impar para ver por onde cada um iria,e eu fiquei
com a escada.
Prendi bem a pistola firme
no cinto e subi as escadas.Admito que estava tendo um mal pressentimento sobre
esse caso, mas como seria isso que pagaria minhas contas, não tenho muito o que
reclamar.
Eram vinte degraus em
perfeita vertical.O sol estava forte e deixava os degraus de ferro quentes o
suficiente para fazerem minhas mãos arderem.
Quando cheguei ao topo, me
vi diante de um telhado de alumínio, não esses alumínios que se encontram em
qualquer telha barata de toda cidade grande,era um alumínio mais resistente, como
era um depósito deveria respeitar as normas de segurança do país.
Eu consegui me apoiar na
telha e dei uma olhada em volta. Percebi que logo a frente havia uma entrada
para um duto de ar, dava para eu entrar la, mas apenas rastejando. Me agachei para
entrar no duto. Era bastante apertado,mas tentei fazer menos barulho possível.
Depois de rastejar alguns
metros e fazer algumas curvas,encontrei uma brecha no fundo do duto, uma grade
que fazia o ar circular na sala a baixo, de la se conseguia ver dois dos três
suspeitos, como Caio falou eles usavam roupas pretas, na verdade mantos negros
com as partes internas cor vermelho sangue. Seus mantos eram longos e na altura
da cabeça se estendiam até fazer o capuz que me falaram. O suspeito da esquerda
era o mais alto e além do manto, usava um boné vermelho sujo, uma luva de couro
surrado na mão direita e uma cicatriz no estilo "scar" cortando o
olho esquerdo. O da direita tinha cabelo grande,lambido no estilo emo de banda
pequena,tinha um piercing na sobrancelha direita,um na boca e aparentava ser o
mais jovem.
Eles estavam falando
alguma coisa,e como eu estava longe não dava pra ouvir direito,mas eu comecei a
respirar um pouco mais calmo e prestei muita atenção,só assim eu consegui
escutar...
__... chegando o grande
dia__disse o suspeito com boné.Ele tinha uma voz meio rouca e parecia meio
fanho._Diga Akrael,como vão os preparativos?
__Estão indo bem,a
quantidade de sacrifícios está quase alcançando o número desejado!_Disse o
Akrael ao outro.Ele que por sua vez tinha uma voz bem mais aguda. __ Hum! Muito
bem. O Mestre ficará muito feliz com seus esforços,e.....__admito que o jeito
brusco que ele parou de falar me assustou__Parece que um de nossos convidados
resolveu aparecer.
Impossível,como aquele
maldito me percebera ali?Ele estava praticamente de costas para mim e eu não
havia feito nenhum barulho,como poderia saber que eu estava lá?!
Antes de eu conseguir
pensar em algum plano eu escutei um som realmente aterrorizante. O duto de ar
estava cedendo com o meu peso.Tentei sair daquela direção o mais rápido
possível, mas não deu, caí de mais de 5 metros com tudo,a minha sorte é que caí
sobre umas caixas abandonadas que tinham no chão,o que amaciou minha queda.
__Ora ora...se não é
Jason Rodriguez na minha humilde casa.__disse o cara de boné, sorrindo de uma
maneira tenebrosa.
__Meu nome é Jeson
RA-MI-REZ seu idiota,__ disse levantando
com dor nas costas__ e você está preso por assassinato,chacina,tráfico de
drogas,porte ilegal de armas e por ser muito feio.__Disse eu tentando disfarçar
a dor da queda.__Perae, como você sabe meu nome?__finalmente cai na real e
percebi que não tinha me apresentado.
__Ah!Meu visitante “inesperado”,
eu sei muito sobre você. Todos eles me falaram que você viria.__ele disse
mudando o tom de voz para alguma coisa mais irônica.
__Eles?! Quem são eles?
__Como assim "quem
são eles?" Sua família seu idiota__ quando ele disse isso, Akrael começou
a rir,o que só serviu para aumentar minha raiva. Ele não podia ter conhecido
ninguém da minha família. Nem eu os conhecia. Pelo que eu sabia meus pais me
abandonaram em frente a uma igreja de uma parte pequena da cidade. É claro que
ele estava só tentando brincar com minha paciência.
Em um gesto meio impulsivo,
saquei minha arma.
__Aí cara!__ puxei o cão
da arma com o polegar__ Não sabia que falar da mãe é uma coisa baixa? Mais uma
coisa pra lista de ocorrência, porcaria.__ele riu de maneira provocadora.
__Não é comigo que você
tem que se preocupar. Akrael,faça o que deve ser feito.
"Ha,ridículo" eu
pensei no início,até o franzino "emo" que estava ali parado começou a
soltar uns ruídos estranhos,era como se ele estivesse rosnando para mim.O som
era como trovões poderosos que estivessem dentro do depósito.Seus olhos eram
castanhos.Exatamente isso que eu falei:"ERAM" castanhos.De um
momento para o outro eles ficaram
avermelhados,como se um demônio tivesse entrado no corpo dele.Sei que não
existe essa historia de demônios,mas é a única descrição que eu consigo
imaginar.
De maneira brusca, Akrael
veio correndo em minha direção.Não me lembro se gritei para ele parar ou se eu
avisei que ia atirar,o que a norma policial pede,mas quando me dei por mim eu
já tinha acertado um belo tiro no peito dele.
Sim,agora aquele magrela
assustador estava no chão,jorrando sangue para todo o lado.Agora só tinha
sobrado eu e o cara de boné...e o imbecil do Caio que estava demorando pra
aparecer .
__Tá bom,você viu o que acontece com quem me ataca né?Agora vai se
entregar ou vo ter que te meter bala também?
__Hum.Você acha que já
acabou?
__Como assim?__maldita
pergunta.Quando fiz ela , ouvi um barulho vindo de onde estava o corpo de
Akrael.Me virei lentamente e me deparei com uma cena que realmente me
assustou.Akrael estava vivo ainda.Ele estava se levantando,com ainda mais
ferocidade do que antes.O sangue ainda escorria de seu peito,o que deixou o
ambiente ainda mais medonho.
Novamente ele veio
correndo em minha direção.Pensando bem ele corria bem rápido pra alguém que
tinha acabado de tomar um tiro.Conseguiu chegar em mim em uma velocidade
incrível e desferiu um soco na minha barriga,que me fez voar a uns 3 metros de
onde estava.
Em condições normais eu
teria desviado tranquilamente,mas eu estava paralisado de medo.Além de presenciar
a suposta "reissureição" de uma pessoa,eu sentia uma presença
maligna,algum tipo de pressão negra que me envolvia.
Com a queda,minha arma
saiu de minhas mãos,rolando para perto dos pés do cara de boné.Minha barriga
doía muito.Eu sabia que se ficasse parado com medo iria ser massacrado por
aquele cara.Eu fiquei imaginando como alguem tão pequeno como ele e que tinha
acabado de tomar um tiro poderia ser tão forte, quer dizer, eu peso quase uns
90 Kg e ele não deve passar de 65,como
conseguiu me arremessar tão longe?Antes que eu pensasse mais,voltou ele a
partir pra cima de mim.Me levantei e corri em direção a minha arma,mas,antes
que eu pudesse alcançá-la, Akrael já tinha engatilhado um chute pra cima de
mim.
Ele deu um chute daqueles
de cima pra baixo,eu consegui desviar dando um salto para o lado,o que fez que
ele acertasse umas caixas de madeira e quebrando em mil pedaços,me levantei
rapidamente e deferi um soco rápido bem no meio da cara,o que fez ele cambalear
para trás,foi aí que encontrei a oportunidade de ficar por cima e continuei a
dar socos.Uma bela seqüência de socos,todos certeiros.A cara daquele maldito ja
estava sangrando muito,mas não parecia que ia desistir tão facilmente.
Eu já estava cansado de
bater. Minhas mãos doíam,o rosto dele
parecia feito de pedra.Eu estava indo bem,até ele conseguir segurar
minha mão,e que força incrível,era como se ele estivesse quebrando minha
mão.Por um minuto ele ficou olhando para mim,bem nos meus olhos.Ele tinha um
olhar penetrante,seus olhos estavam vermelhos como sangue,o que me fazia
confundir como o mesmo espalhado por toda a sua face.Eu fiquei olhando bem nos
olhos dele.Não dizia nada.O silêncio tomou conta do saguão,a não ser pelo riso
sombrio do rapaz de boné que estava apenas observando.
__Agora,esse é o seu
fim!__disse Akrael com uma voz que não era a que eu tinha escutado antes,uma
voz que não era a dele.Essa era uma voz com um tom sobreposto ao tom de voz
dele,quer dizer,a voz dele saía,mas junto com ela saía uma voz mais rouca como
um martelo batendo em uma pedra.
Quase no mesmo instante
que ele me falou aquela frase,vi uma aura negra saindo de seu corpo. Aquilo
paralisou minhas pernas.Era uma sombra horrível que tomava a forma de um
monstro,com olhos sedentos de carne humana.Achei que aquele realmente seria meu
fim,mas quando eu ia receber o golpe de misericórdia,a cabeça de Akrael explode
em um barulho ensurdecedor bem na minha frente.
Quando me dei por
mim,percebi que um anjo tinha me salvado...........ta certo,não era bem um
anjo,na verdade era o Caio que tinha dado um tiro certeiro bem no meio da testa
do meu agressor.Aquele corpo que agora tinha apenas 1/3 da cabeça dele soltou
minha mão e caiu.Uma cena que perturbaria os sonhos da maioria das pessoas,mas
que pra mim,não sei por que,estava sendo maravilhosa.O sangue daquele monstro
estava jorrando como água em uma mangueira,batendo bem no meu rosto.Agora eu só
queria ver esse cretino levantar de novo!
__Ei parece que eu
cheguei na hora certa né!__disse Caio coçando a nuca com a ponta do dedão e
dando uma risada sem graça.Eu percebi que sua camisa também estava suja de
sangue,o que indica que deve ter tido uma bela luta.
__Por que você demorou
seu imbecil?!__perguntei ele enquanto tentava tirar o sangue da cara__Eu tive
um trabalhão aqui.
__A não vem com essa
não,eu tive que espancar um babaca lá atrás.Acredita que o filha da mãe
sacaneou meu cabelo?
__Acreditaria se eu
dissesse que acredito?
O cabelo de Caio era um
loiro com pontas pretas, quase acinzentados, e aparentava estar um pouco
"desbotado",mas esse não é o importante.
O malandro de boné estava
aplaudindo e rindo.
__In-crí-vel.Sinceramente,eu não esperava que vocês fossem tão bons
assim!__disse ele
__Ei,cala essa boca ,tu é
o que menos pode falar aqui!__eu disse me virando pra ele.
Ele não reagiu enquanto
foi algemado pelo Caio. Chamamos a viatura para levar ele embora e uns outros
ficariam para arrumar a bagunça.
Quando ele foi posto no
carro,fiz questão de acompanhá-lo no banco de trás,precisava de umas respostas!
__Qual é o seu
nome?__perguntei
__Calistiel.__respondeu
ele olhando para a janela
__O nome verdadeiro por
favor.
__Roberto!
__Afinal,o que aconteceu
lá atrás? __fui direto ao ponto.
__Huhuhu__ele riu daquela
maneira provocadora que eu odeio.__Exatamente o que você viu.
__Nossa,você está em uma posição
bem favorável para ficar de sacanagem!__tentei usar o máximo de ironia em
minhas palavras,para ele entender que estava prestes a tomar um soco.
__Está surpreso não é?Não
é todo dia que se dá um tiro em alguém e essa mesma pessoa quase te mata
depois.__não é que ele foi mais irônico que eu__Isso é o que acontece depois
que se vende a alma "Aquela pessoa"!
__E quem seria
"aquela pessoa"?
__Não esquenta,em breve
ele irá aparecer.Você terá muitas respostas quando esse dia chegar,mas eu já
aviso:quando "ele" vier para este mundo,muita gente irá morrer!
__Para este mundo?Como
assim?Como eu posso parar ele?__perguntei cada vez mais nervoso.Depois dessa
última frase de Roberto,ele não disse mais nada,só ficou olhando para a
janela.Lá fora tinha começado a chover,esses pequenos temporais de verão.Eu ja
não tinha mais ânimo para perguntar mais nada.Eu queria uma bela tarde de
sono.O problema é que depois daquele dia eu nunca mais teria uma noite boa de
sono,e boa parte daquilo foi devido a uma marca feita pela lâmina de uma faca
na parte de trás do pescoço de Roberto.Era nada mais do que uma cruz de cabeça
para baixo!!!!